A Lei de Arbitragem brasileira chega neste mês aos 12 anos de existência, mais fortalecida que nunca. Pelo menos, é a avaliação que fazem advogados que trabalham com essa forma alternativa de resolução de conflitos. Segundo afirmam, a norma, que foi sancionada no dia 23 de setembro de 1996, inovou por permitir julgamentos mais céleres do que os realizados pelo Judiciário e, principalmente, por possibilitar que as divergências fossem apreciadas por pessoas especializadas no tema envolvido. Com base no crescimento do instituto, eles asseguram: a arbitragem, em um futuro próximo, estará totalmente integrada ao dia-a-dia do jurisdicionado.

O presidente da Comissão de Arbitragem e Mediação da Seccional paulista da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP), Arnoldo Wald Filho, explica por quê. De acordo com ele, nos últimos dez anos ocorreu verdadeira revolução cultural em relação à arbitragem e à mediação. Muitas causas correm sob sigilo, mas é certo que o número de mediações vem crescendo em ritmo acelerado no campo das pequenas causas - incluindo-se as trabalhista e as de relações de consumo. Segundo Wald Filho, também no mesmo período, o Brasil aumentou sua participação na Corte Internacional de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional: passou de um dos últimos lugares do ranking para o primeiro na América Latina e quarto no mundo - logo após os Estados Unidos, França e Alemanha e à frente da Inglaterra, Itália e Espanha. De acordo com o advogado, o interesse do País acerca do tema também cresceu: foram editadas 120 obras sobre o assunto nos últimos dez anos.

A avaliação do especialista da OAB-SP é a de que tanto o legislador como o Poder Judiciário e, principalmente, os meios empresariais têm optado mais pela mediação. Exemplos recentes é o convênio firmado pelo Poder Judiciário e a Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp) para a criação de câmaras de mediação e a realização de mutirões em todo o Estado, assim como a implementação do Movimento Nacional pela Conciliação, pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Ambos os projetos foram criados no ano passado. Essa mobilização, de acordo com Wald Filho, acarretará conseqüências positivas.des de Direito.

Estou muito animado com os resultados da arbitragem no Brasil, que observamos no ano passado. As empresas nacionais e internacionais vêm recorrendo a ela como forma alternativa de resolução de conflitos com muita freqüência. Em contratos internacionais, pode-se dizer que o instituto é a regra e a jurisdição comum, a exceção. A Corte Internacional de Arbitragem destacou o Brasil como um dos principais países usuários da arbitragem, o que deve ser certamente motivo de orgulho para os profissionais do direito - afirmou Wald Filho, para quem, nos últimos anos, o procedimento "evoluiu em proporções geométricas".

Em relação aos desafios da arbitragem, Wald Filho ressaltou que é preciso "popularizar" esse instrumento. Nesse sentido, ele destacou algumas metas. "É nosso desafio popularizar a arbitragem e a mediação, para que esses instrumentos passem a fazer parte do dia-a-dia do jurisdicionado na resolução de pequenos conflitos, contribuindo, dessa forma, para que a Justiça seja prestada com menor custo e tempo. Pretendemos também estimular o ensino da disciplina de Arbitragem e Mediação nas faculdades de Direito, já que os bacharéis saem das escolas preparados apenas para o litígio, e também trabalhar pela presença obrigatória do advogado em todas as formas de conciliação, a fim de garantir o direito das partes envolvidas", afirmou.

Outro objetivo de Wald Filho é transformar o Estado de São Paulo em um grande centro de arbitragem. Na avaliação do advogado, isso não é impossível. Somente em 2006, o Setor de Conciliação do Tribunal de Justiça de São Paulo, por exemplo, realizou 15,9 mil audiências, com sucesso em 3,5 mil casos. Medidas como essa ajudam a reduzir a demanda da Justiça, estimada em 500 mil novos processos a cada mês.

O advogado da área empresarial Rodrigo Lins e Silva Cândido de Oliveira - do Coelho, Ancelmo & dourado Advogados - esclarece que esse crescimento ocorre devido às facilidades introduzidas pela lei. Ele explica que a previsão de usar a arbitragem quando algo não sair como esperado pode ser incluída no contrato pelas partes. Mas não é só. Elas podem também estabelecer a corte arbitral em que o conflito será apreciado, assim como a legislação e o idioma, nos casos internacionais, que deverão ser aplicados. Elas podem ainda escolher quem serão os árbitros para resolver a pendência. "Além disso, há outra questão. Os processos judiciais são, por definição, públicos. Muitas vezes não interessa às empresas envolvidas a divulgação de determinado conflito. Elas, então, têm a possibilidade de estabelecer uma cláusula de confidencialidade", explicou o advogado.

Oliveira esclareceu que a aplicação da lei deslanchou depois do julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) em que foi declarada constitucional, em dezembro de 2001. A ação teve início em 1995, quando uma empresa requereu a homologação de uma sentença arbitral proferida na Espanha, para que tivesse efeitos no Brasil. Em princípio, o pedido foi indeferido. No ano seguinte entrou em vigor a Lei da Arbitragem dispensando o procedimento para validar esse tipo de decisão. Ao julgar o recurso da companhia, o então ministro do STF Moreira Alves levantou a questão da constitucionalidade da norma. No debate, venceu a corrente que considerava a lei um grande avanço e, por isso, não representava ofensa à Carta Magna.

"Podemos dividir a aplicação dessa lei em duas fases. A primeira, antes do julgamento, em que havia insegurança, uma vez que a arbitragem, se realizada, poderia ser argüida no Judiciário. A segunda foi depois de a norma ter sido declarada constitucional. O entendimento do STF pela constitucionalidade foi um marco muito importante, pois possibilitou maior segurança às partes para elegerem outra via para a solução de eventuais problemas", disse o advogado.

A advogada Alessandra Cavalcanti Sabino, da equipe de especialistas em arbitragem do Tostes e Associados Advogados, disse que o resultado do julgamento foi determinante para o desenvolvimento da arbitragem no Brasil. "Com o advento da Lei 9.307/96, a Jurisdição deixou de ser monopólio estatal. Ao firmar um contrato, as partes têm a liberdade de decidir se levarão eventuais dissidências ao crivo do Poder Judiciário ou se as controvérsias serão solucionadas pela arbitragem", disse.

Ainda em relação à arbitragem internacional, Alessandra Cavalcanti destaca a ratificação, pelo Brasil, em 2002, da Convenção de Nova York de 1958, que dispõe sobre o reconhecimento e execução de decisões arbitrais estrangeiras. "Isso permitiu que o Brasil conquistasse a desejada credibilidade internacional. Certamente, um país que atua em conformidade com as consagradas regras internacionais de Direito Arbitral propicia que os negociadores globais de contratos financeiros e comerciais sintam-se mais seguros e confiantes diante de eventual conflito contratual", afirmou.

Embora a lei de arbitragem tenha trazido diversas inovações ao sistema, Alessandra Cavalcanti destacou que o Brasil ainda tem alguns pontos a enfrentar. "Entendo que todas as barreiras que impediam a implementação foram removidas, através do esforço conjunto dos três Poderes, mas o Brasil ainda tem muito a se desenvolver. Um exemplo é que em alguns estados dos EUA, nas questões que envolvem até US$ 7.500 a arbitragem é obrigatória. O Brasil ainda não chegou a esse patamar", disse.

22/09 – Jornal do Commércio Brasil